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A Três Mãos

A três mãos se escreve, a dois olhos se lê, a um o pensamento que perdura

A Três Mãos

A três mãos se escreve, a dois olhos se lê, a um o pensamento que perdura

24 Jan, 2017

Escondidos!

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Havia muitas semanas que não dormiam em paz. Quando chegaram ao apartamento após horas às voltas pela cidade de forma a afastarem quaisquer perseguidores, estavam arrasados e aproveitaram ambos para tomar um banho e enfiarem-se na cama. Precisavam realmente de descansar.

Após uma noite bem dormida, Arlindo acordou cedo. Tentou perceber se já era dia mas não conseguiu tal era a opacidade das janelas. Saiu então da cama onde Lídia dormia profundamente e esgueirou-se pelo apartamento até chegar à cozinha. Aí abriu a janela e então percebeu que já era dia. Procurou uma roupa que lhe servisse entre a muita que lhe tinham deixado e evitando fazer barulho saiu, levando unicamente consigo a chave do apartamento de forma a poder regressar sem ter de acordar a namorada.

Desceu as escadas e penetrou na rua. Não imaginava onde se encontrava, mas provavelmente não era em Lisboa. Precisava no entanto de diversas coisas. A primeira seria recuperar a sua identificação que desaparecera por completo, depois dinheiro e finalmente um telemóvel.

Observou o ambiente citadino e descobriu, no meio de alguns carros estacionados, o tal agente anafado que os acompanhara até ali.

Devagar aproximou-se dele:

- Bom dia senhor agente.

- Bom dia…

- Passou aqui a noite?

José Ramos respondeu com maus modos:

- Não, estive em casa. Porquê?

- Por nada… Necessito de diversas coisas. Será que me pode ajudar?

- Depende… o que é?

- Preciso da minha identificação, depois de dinheiro e finalmente de um telemóvel.

- Para que quer isso tudo?

- Porque sou gente e… quero continuar a ser!

Arlindo respondeu também de forma abrupta, que não era seu hábito, de modo a não deixar dúvidas ao agente Ramos. Este pegou então no telefone e ligou para o chefe. Esperou que Arlindo se afastasse do carro e por fim perguntou:

- Olha lá mas eu agora sou alguma ama?

- Que se passa Ramos?

- Saiu daqui agora o teu herói… e disse-me que necessitava de identificação, dinheiro e um telemóvel. Deve achar que ando com isso tudo aqui comigo…

O chefe escutou-o e respondeu:

- Tu sabes que esse casal ajudou a apanhar uma data de criminosos procurados por todo o lado menos na Lua!

- Ó chefe sei disso tudo… Mas como fazemos? O meu ordenado não chega para avarias destas.

Um silêncio cavernoso instalou-se. Depois a resposta:

- Antes de mais eles têm de mudar de identidade. Não quero que sejam perseguidos futuramente. Só depois faremos o resto…

- E se eles não quiserem?

- Querem, querem… Diz-lhes que vais tratar já do assunto.

José Ramos desligou a chamada, saiu com dificuldade do carro devido à sua gordura e encaminhou-se para perto de Arlindo. Colocou-se a lado do causídico e como se não fosse nada com ele foi informando:

- O meu chefe deu-me a indicação que ambos terão de mudar de identificação. Por vossa segurança… - acrescentou.

Arlindo abriu os olhos num espanto e comunicou:

- Nem pensar!

- Vá sôtor… pense bem! A sua vida vale mais que um nome.

- Deixe-se disso. Já fui baptizado uma vez.

José Ramos percebia ambas as situações mas tornara-se óbvio que a vida deles poderia correr perigo. Entretanto Arlindo que vivia interiormente um turbilhão de emoções acabou por perguntar:

- E que nome teríamos? Tem alguma ideia?

- Tenho sim… Lídio e Arlinda!