Ajeitou a gravata quando pressentiu que a porta se preparava para ser aberta. Um homem corpulento, de tez pálida penetrou na sala estendendo a mão para a visita. Não obstante o aspecto volumoso parecia afável.
- Engenheiro Lídio Messias? Como está? – Cumprimentou.
Lídio retribuiu:
- Muito bem! Mas trate-me pelo meu nome, simplesmente.
O anfitrião sorriu com a franqueza e acrescentou:
- Claro. Faça o favor de se sentar.
E continuou:
- Veio responder ao anúncio?
- Exactamente! (...)
Vasco nascera no seio de uma daquelas famílias modernas onde tudo era assente numa lógica de verdade, sem subterfúgios nem desculpas.
Deste modo o petiz desde muito novo foi iniciado nas realidades humanas. A barriga da mãe crescia e quando perguntou porquê o pai explicou-lhe, numa linguagem incompreensível para a criança, todo o percurso da concepção de um filho. Mais tarde foi a mãe que teve de se empenhar em desmistificar a razão da avó Lurdes ir todos os domingos a uma (...)
A notícia penetrou-lhe na alma tal qual um murro na boca do estômago. A dor ficara presa dentro de si sem hipótese de sair. Um tormento!
Em toda a sua já longa vida habituara-se a lidar com o imprevisível e o inesperado. E acatara serenamente tudo o que o destino, ou fosse lá o que fosse que lhe chamassem, lhe reservara. Tudo… menos aquele momento.
Aceitara que a mãe tivesse abandonado o pai, trocando-o por um qualquer artista plástico de qualidade assaz duvidosa. Acatara com (...)
A noite havia sido tórrida. Entre ambos uma miríade de beijos, carícias e desejos desvendados. Finalmente cansados, foi ela a primeira a falar.
- E se ninguém conseguisse mentir? – Perguntou naquela voz melosa de mulher apaixonada.
Ele olhou-a de soslaio e percebeu que a pergunta tinha outra intenção que apenas uma mera resposta dele. Ainda assim arriscou:
- Não haveria Pai Natal. Nem Natal. Nem prendas, nem subsídios (ups… mas isso já não há!!!). Não haveria política, (...)
O causídico lia o documento com invulgar atenção. De quando em vez rasgava o cabelo baço e lustroso com o dedo mindinho, sinal que algo não estava bem.
A cliente, jovem e bonita, sentada na sua frente a seu convite, seguia o vaivém do olhar com profunda expectativa. As folhas A4 eram passadas devagar e ainda assim o advogado voltava atrás para reler ou perceber alguma divergência.
Ao fim de um bom pedaço de incontável tempo, levantou os olhos dos papéis e recostando-se à (...)
Chegou ao aeroporto um minuto depois da hora marcada. Ainda a viu ao longe, reconhecendo-a pelos longos cabelos negros. Chamou-a a plenos pulmões, recolhendo desta forma a atenção dos viajantes do aeroporto, mas ela, impávida e serena continuou a subir a rampa até desaparecer no meio de uma multidão de passageiros.
Ergueu-se da secretária e aproximou-se da frondosa janela onde a chuva batia com força, impelida por um vento que ganhava violência na bela mata de Monsanto. A (...)
O velho Alexandre foi sempre o meu porto de abrigo para muitas, talvez demasiadas, tempestades. Fazia algum tempo que não o via. Procurei-o na sua velha casa junto ao mar. Estava um dia primaveril, com o sol a encher o dia de luz e alegria. Sabia-o ali, como sempre, de cachimbo gasto e apagado na boca e olhar permanentemente atento no horizonte, onde os dois azuis se juntavam.
- Olá velho Lobo do Mar!
- Olha o maltez! Hum aqui a esta hora! Há coisa…
Ele tinha esse singelo condão (...)
Teobaldo chega a casa e liga o interruptor da luz. Nenhum sinal!
Insiste. O mesmo resultado!
- Será que não paguei a conta da electricidade?
Tenta num instante, relembrar-se e tem a certeza de ter pago.
Teima. Nada.
Finalmente penetra no apartamento e aguarda que a visão se habitue à escuridão.
- Provavelmente o quadro dos fusíveis está desligado… - ocorre-lhe.
Depois apalpa o telemóvel, pega-lhe e com a luz do visor dá alguma vida à entrada. Finalmente é com um (...)
Preâmbulo
Início hoje a colaboração neste espaço com um conjunto de prosas de 400 palavras (nem mais nem menos). Sem título definido para cada um dos textos, este foi um exercício que gostei de assumir. Eis o primeiro:
Caía uma chuva miúda, quase pó! A luz mortiça dos candeeiros deixava antever traços finos e oblíquos de água fria. Alcina refugiou-se debaixo do toldo de uma velha loja de ferragens, fechada havia muitos anos. A noite não estava convidativa (...)