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A Três Mãos

A três mãos se escreve, a dois olhos se lê, a um o pensamento que perdura

A Três Mãos

A três mãos se escreve, a dois olhos se lê, a um o pensamento que perdura

14 Mai, 2015

O retrato!

Ergeu o olhar para o lado oposto da mesa mas a cadeira, tantos anos ocupada, encontrava-se agora vazia. Cinquenta e cinco anos em conjunto! Mais de meio século. E os últimos anos haviam sido de suplício, luta permanente contra uma doença que teimava em evoluir drasticamente. Lembrou-se da promessa entre ambos, muitos anos antes de qualquer enfermidade... - Nunca me leves para um lar, quero morrer na minha cama   - pedira Amélia um dia. Ernesto prometera que assim faria. E fez... (...)
Acordou tarde. Não era costume. Mas Verónica saíra de sua casa, pelas 6 da manhã. Ainda arrumou a cozinha, tomou banho e só depois se deitou. Adorara a noite. Jamais nos seus 36 anos de vida tivera uma assim. Filipe não era um melómano, mas adorava música e aquela mulher puxara por ele. Easy Livin dos Uriah Heep, Everyday dos Slade, Grand Hotel dos Procol Harume tantas, tantas outras músicas que ouviram durante toda noite. Parecia uma criança a quem haviam dado um brinquedo (...)
Já raiava o dia quando abriu a porta do prédio. Subiu ao 6º andar e meteu a chave à porta. Rodou duas vezes e entrou finalmente em casa. Ligou a luz que iluminou profusamente uma entrada bem mobilada. Diversos quadros modernos, uma cómoda herança de família e um candeeiro de pé para além dos projectores que emanavam do tecto falso. Dirigiu-se ao quarto e despiu o casaco comprido, cinza. Descalçou os sapatos de salto alto e desceu ao seu metro e setenta. Sentou-se à beira da cama (...)
27 Mar, 2015

Perspicácia!

... Retalho anterior   O caminho entre o cemitério e casa foi feito lentamente, como se houvesse uma força a empurrá-los para longe. Lucinda, agora viúva, pendurara-se no braço de uma das filhas. Lídia agarrara-se carinhosamente ao braço de Arlindo. Pela primeira vez sentia o calor do homem que nascera na aldeia e partira cedo para a cidade e com quem desejava partilhar o futuro. A mãe de negro (...)
Tamborilava os dedos no volante ao som de Sultans of Swing, dos Dire Straits. Uma música que ele simplesmente adorava e que estava a tocar naquele instante na Rádio Nostalgia. O trânsito naquela manhã desenhava-se caótico. Filipe experiente e conhecedor logo se lembrou:  “Deve ser algum acidente”. E como costumava dizer para si e para os outros, o que não tem solução está solucionado por si, não se preocupou. À sua volta as pessoas dentro dos carros reagiam de forma (...)
23 Mar, 2015

Na aldeia

... Retalho anterior   O relógio digital do carro marcava meio-dia, talvez daí a razão da fome que sentia. Como faltavam poucos quilómetros para chegar à aldeia achou melhor parar para comer pois, certamente, ninguém da família contaria com ele para almoçar. Desde que saíra da estação de serviço que o seu pensamento voava por entre as horas passadas com Lídia. A última mensagem, da (...)
Aos nossos leitores, em janeiro, foi deixado um desafio, como podem aqui recordar. A Lídia, nossa gentil e estimada leitora, o seu contributo enviou, quase de imediato. Por minha culpa, dado não consultar a minha conta de correio eletrónico da yahoo há vários meses, só agora nos é possível partilhar esta pérola com os nossos leitores, ao som do desafio: Slave to love.     (...)
28 Fev, 2015

Ao telefone

... Retalho anterior   Arlindo sabia que a precipitada demissão da Directora-Geral da empresa estava umbicalmente ligada à sua entrada. Muitas vezes lhe ligou e mandou mensagens para poderem falar, antes da sua admissão, mas Lídia emudecera após o último encontro no seu gabinete. O jovem segurança optara por trabalhar somente de noite para poder estudar de dia. Um sonho alimentado desde jovem… E (...)
Recordo-me dos tempos idos, Dos tempos sem tempo. Lembro-me dos dias tristes, E das amarguras vãs.   Recordo-me de alegrias fugazes, E sonhos longamente perdidos. Lembro-me das noites brancas, E de amores sentidos e amados.   Recordo-me das faces claras, Dos sorrisos e das carícias. Lembro-me das figuras simples, Mas serenas e amigas.   Recordo-me de não ser, O que sempre desejei. Lembro-me de querer   O que nunca pude.   Recordo-me que o amor, Foi então a (...)
15 Fev, 2015

O pobre e o rico

A noite abraçou a aldeia com o seu manto negro e silencioso. Apenas a chuva que caía abundantemente se escutava a bater nos telhados ou a cair dos beirais. Júlio atravessava o casario devagar, cansado de mais um dia de jorna dura. Só assim podia sustentar a pobre família. A sua casa, que mais parecia um pardieiro, situava-se no outro lado da povoação. E o frio e a chuva que se entranhava no corpo franzino tolhia-o ainda mais. O sino tocou oito badaladas. Contou-as como se fossem (...)